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Você já se perguntou o que é o "vazio"?

Atualizado: 31 de jul. de 2020

Por Tâmara Cristine Gomes


Baseado no texto: La apertura como matriz de la compasión: no dualidad y vacío, de Ethan Nichtern

Se observarmos a definição do dicionário, vazio é aquilo que não contém nada, não tem substancialidade, ou ainda tem o sentido figurado no qual remete a uma falta de sentimentos/ preocupações.


Nos textos da filosofia budista o vazio é um dos temas mais instigadores, todavia os pesquisadores tendem a mergulhar em visões próximas da metafísica, assim, Nichtern em sua reflexão: “Abertura como controladora: não dualidade e vazio” busca compreender o vazio a partir de um olhar mais psicológico e relaciona-lo com a compaixão, considerando-os interdependentes. Nichtern define e o vazio na perspectiva budista, mas especificamente nos ensinamentos, como verdade absoluta, última ou secreta.


No sutra do coração todos os fenômenos são considerados vazios, como as sensações, as percepções, as formações mentais, a consciência, e até mesmo a própria forma é descrita como sendo vazia. O que implica em dizer que, os fenômenos não apresentam existência em si (intrínseca), pois são interdependentes, ou seja, os mesmos não existem sem que nós atribuamos um nome/conceito.


Para compreendermos melhor, imaginemos a foto de um(a) ex-namorado(a), que nada mais é que uma junção de papel e tinta, mas pode aludir lembranças de momentos difíceis ou despertar sentimentos como saudades de momentos felizes, assim, ela em si não passa de um objeto vazio, mas o sentido que atribuímos preenche-a de valor. Em linhas gerais, tendemos a avaliar e julgar a realidade a partir de uma verdade relativa, ou seja, aquilo que a foto remete e ignorar a existência de uma verdade absoluta, que implicaria em compreender que uma foto é apenas uma foto (papel/tinta).


Uma das causas que influenciam nossa compreensão distorcida, é percebermos às experiências a partir de um olhar linear e estático, portanto, um dos princípios básicos que precisamos ter em mente na luta contra o sofrimento é a impermanência, é que todo (fenômeno/ experiência) está em transformação constantemente.


A percepção ilusória e distorcida nos encaminha para um estado de sofrimento, que se materializam cada vez que, tentamos prender uma nuvem em nossas mãos... a medida que queremos estagnar as águas do mar, congelando-as no passado. Sofremos ainda, quando queremos segurar alguém que amamos, mas esse alguém deseja partir... sempre que nossos planos pra o futuro são frustrados... ou seja, sofremos cada vez que esquecemos que a impermanência abre, solta, leva e traz e quando manter/ afastar algo, nem sempre está dentro do nosso alcance, ou de acordo com nossos desejos. Como exemplo, podemos pensar em quando estamos vivenciando situações muito prazerosas, como um romance, construímos lindos castelos de areia e aspiramos que o mesmo calor do início permeie toda relação.


Para Nichtern, a confusão que resulta dessa distorção da percepção é a responsável pelo sofrimento e consequentemente, afastamento dessa verdade absoluta, então para que tenhamos mais clareza, precisamos entender os fluxos da vida como impermanentes, assim, não iremos sofrer tanto na ocasião em que estivermos olhando nosso castelo de areia sendo arrastado pelas ondas do mar.


Uma outra armadilha que captura e conduz a uma percepção ilusória, mas relacionada a praticantes espirituais, vai no sentido inverso, se chama “Bypass” espiritual, ou desvio espiritual, que implica em usar ideias da pratica espiritual no enfrentamento de problemas emocionais e feridas psicológicas não resolvidas. (John Welwood, 1980)


Conforme pensamento de John Welwood, com o acesso ao conceito da verdade absoluta, muitos praticantes espirituais tendem a valorizar a compreensão do absoluto em detrimento do relativo e simplesmente varrem para de baixo do tapete o relativo (experiências dolorosas), reprimindo sentimentos como a raiva, e inveja/ciúme, o desejo e o apego, entre outros, por se tratar de emoções ditas perturbadoras e propagadoras de confusão.


Assim, diante do sofrimento há uma dicotomia, perceptível nos métodos adotados pelas escolas de filosofia budista, para vivenciar o vazio, ou seja a felicidade, pois enquanto umas privilegiam única e exclusivamente a intelectualidade e o domínio de concepções, outras priorizam a experiência como maneira sui generis.


Para Ethan Nichtern, a escola Madhyamaka, conhecida como doutrina do vazio, faz a junção da filosofia com a prática budista, a mesma foi fundada pelo filósofo indiano Nāgārjuna (c. 150-250 d.C), defende a importância de se ter a clareza conceitual, pois sem ela a meditação pode atuar como uma ferramenta promotora de crenças equivocadas, como também a prática meditativa.


Continuando a reflexão de Nichtern: “se desprezamos a verdade relativa e meditamos sem questionar essa ideia, nossa prática nos fará aprofundar nosso desvio espiritual, mesmo pareça ajudar, pode conter uma ilusão que o confunde. Por exemplo, na prática da atenção plena, trabalhamos com um ponto de ancoragem, e a instrução é: toda vez que divagar, identifique esse pensamento como tal e retorne à experiência do seu corpo. Se essa técnica não for contextualizada em uma estrutura conceitualmente clara, poderá levar a ideias confusas, como que os pensamentos são ruins. O palestrante aborda o contexto de treinamento em que os alunos são particularmente interessantes, buscando momentos de reflexão conceitual. Sem entendimento conceitual, mesmo a prática da meditação pode ter o efeito de aumentar nossa opressão.


A compaixão é um sentimento que nos expande e que direciona para o outro uma aspiração genuína de felicidade, um exemplo de compaixão é quando pensamos nas mães, elas sabem a medida certa, compreendem a necessidade de, em determinados momentos, não atender os desejos dos filhos para benefício dos mesmos.


Concluímos simultaneamente que a compaixão de si, pode se apresentar como néctar para acolhimento de nossas emoções dolorosas e nos aproximar de um estado sem julgamentos, culpas e pesos uma vazies de sentidos e um oferecimento da nossa presença para as experiências que surgem.


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